quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Hora-aula tecnológica: a nova face da mais-valia

João Francisco do Canto*

Na atualidade, muito se tem discutido acerca do uso das novas ferramentas na educação. Alguns empresários apresentam a tecnologia como a redentora da escola e impõem, sem uma discussão prévia com os diversos segmentos da comunidade escolar, o uso de tais ferramentas como condição sine qua non para a permanência do professor na instituição. Interesses diversos permeiam o processo de implementação de computadores nas escolas, a exemplo do que vem acontecendo nas escolas públicas estaduais.


Não se trata, evidentemente, de se estabelecer uma visão maniqueísta do assunto: idolatrando ou demonizando a tecnologia. A questão é muito mais profunda. Reconhecemos a importância das novas ferramentas no processo ensino-aprendizagem, mas não podemos admitir que a título de modernizar a escola e apresentar às famílias um diferencial mercadológico, professoras e professores sejam submetidos a uma carga extra de trabalho não remunerado. Muitos profissionais vêm sacrificando horas de descanso e de convívio familiar para, além das tradicionais tarefas de organização e correção de provas e preparação de aulas, para as novas atividades surgidas em tempos cibernéticos: inserção de atividades em plataformas virtuais e lançamento de notas em programas nem sempre eficientes e que acabam requerendo um tempo muito maior para a realização da tarefa.

As exigências para que o professor seja detentor de títulos são grandes e, somadas ao trabalho virtual, vêm fazendo com que um final de semana livre seja um sonho distante para muitas professoras e professores. E todas essas exigências não são acompanhadas pelo reconhecimento profissional ou pela valorização salarial. Em muitas instituições, os profissionais são mais descartáveis do que as máquinas que são substituídas de tempos em tempos. A mercantilização do ensino tem feito com que um único professor atenda a muitos alunos, sem que haja uma proximidade maior entre os diferentes atores no processo de construção do conhecimento. Ainda não é clara a percepção de que prédios e equipamentos não educam ninguém, somente profissionais sérios, engajados e reconhecidos são capazes de reverter o triste quadro em que se encontra a educação em nosso país.

O Artigo 7º, XVI, da Constituição Federal diz que “toda atividade não habitual, prestada fora da jornada de trabalho, é considerada como extra e deve sofrer, no mínimo, o acréscimo de 50%”. O professor que habitualmente faz horas extras tem direito à integração dessas horas, pela média, no 13º salário e nas férias. Além disso, o professor tem direito de integrar essas horas habituais ao salário ou receber uma indenização, quando não forem mais exigidas.

A presente reflexão tem como intuito principal fazer com que os aspectos pedagógicos e legais se sobreponham à lógica financeira. É imprescindível que nos conscientizemos de que a mais-valia, o valor suplementar produzido pelo trabalhador, há tanto analisada por Karl Marx, não seja naturalizada sob a égide da modernidade. Lutemos por uma sociedade mais justa, humana e igualitária. Explorar o outro nunca pode ser considerado moderno.

* João Francisco do Canto é formado em Ciências Sociais, professor das redes pública e particular e membro da Diretoria Colegiada do Sinpro Nova Friburgo e Região.