(PROPOSTA ELABORADA COM BASE NAS RESOLUÇÕES DO I CONGRESSO DO SINPRO DE NOVA FRIBURGO E REGIÃO, REALIZADO EM OUTUBRO DE 2007)
A CONJUNTURA NACIONAL
A economia brasileira, plenamente integrada ao capitalismo internacionalizado, vem sofrendo, desde a década de 1990, processo acentuado de desnacionalização e de privatizações, fruto das políticas neoliberais vigentes. Como consequência, tem aumentado sobremaneira a concentração de renda e o desemprego. Este processo vem gerando uma crescente deterioração das condições sociais básicas de vida das classes trabalhadoras. O processo de desenvolvimento do capitalismo brasileiro sustenta-se, essencialmente, no aumento da exploração dos trabalhadores, seja pelo aumento do ritmo ou pela extensão da jornada de trabalho, seja pela perda de direitos sociais decorrente das reformas estruturais – administrativa, previdenciária, trabalhista – efetuadas pelo Estado brasileiro, em comum acordo com os empresários capitalistas.
Os maiores perdedores, neste processo de reestruturação produtiva, têm sido os trabalhadores. O operariado fabril, além de sofrer com o aumento da exploração, pela crescente substituição de trabalho vivo por trabalho morto na produção e pela precarização das relações trabalhistas, vem apresentando uma redução em seu contingente, em números relativos, caracterizando o desemprego estrutural no setor. No campo, dadas a mecanização da agricultura e a rigidez da estrutura fundiária, são também crescentes a taxa de exploração do trabalho e o desemprego daí resultante, produzindo significativa massa de trabalhadores sem-terra. Além disso, amplos setores das camadas médias e da pequena burguesia têm sofrido processos de assalariamento, de desemprego, de perda de poder aquisitivo e de proletarização.
Ainda que parte do contingente de desempregados venha sendo absorvida pelo cada vez mais agigantado setor de serviços, aumenta o número de precarizados – os que não têm uma relação de trabalho formal e/ou constante – ou seja, os terceirizados, os temporários e os chamados informais, sendo estes últimos desprovidos de qualquer direito trabalhista. Há, ao mesmo tempo, um número cada vez maior de pessoas, sobretudo nos grandes centros urbanos, que não dispõem de qualquer possibilidade de virem a se inserir no processo produtivo, estando mesmo para além do limite do exército industrial de reserva.
O marco inaugural do aprofundamento da aplicação do projeto neoliberal no Brasil, iniciada na segunda metade do mandato de Sarney, foi o governo Collor. Apesar do mandato de Collor ter sido interrompido, houve uma reestruturação da propaganda e da mentalidade dos princípios básicos das reformas neoliberais, abrindo, assim, espaço para algumas destas já no curso de seu breve governo, permitindo a inserção do Brasil nos pressupostos do Consenso de Washington. A partir do governo Itamar Franco, o neoliberalismo passou a se aprofundar como política das classes dominantes brasileiras, com a aceleração das privatizações e a gestação do Plano Real, tendo à frente o então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. O Plano Real ganhou popularidade e FHC, graças também a uma descomunal propaganda eleitoral, chegou à Presidência. Seu governo ampliou a política de privatizações e impôs a ofensiva contra a classe trabalhadora, não só através de profundas e significativas mudanças na Constituição e na legislação ordinária, mas também pela perseguição e desmonte dos movimentos sociais e de suas entidades representativas. A aprovação da reeleição, garantida através de compra de votos e coações na base governista, foi passo fundamental para a garantia do segundo mandato de FHC, o qual aprofundaria, com maior intensidade, a aplicação do receituário neoliberal.
FHC não conseguiu, entretanto, completar o desmonte da rede de proteção social e trabalhista existente no país, ainda que bastante limitada. Durante o segundo mandato, a oposição ao governo e à sua política foi crescente, o que culminaria na eleição de Lula. A partir de 1994, em campanha, Lula e o núcleo dirigente do Partido dos Trabalhadores procuraram se aproximar dos setores da burguesia brasileira que foram prejudicados no processo de abertura indiscriminada da economia nos governos de FHC. Ao mesmo tempo, o PT encontrou nos movimentos sociais um forte apoio e base política para a vitória eleitoral em 2002, em função da grande insatisfação popular com os resultados das políticas neoliberais dos governos passados. Esses movimentos depositaram na candidatura Lula a expectativa de ruptura e imediata melhoria em seu padrão de vida. O arco de alianças que elegeu Lula presidente reuniu setores que iam desde o MST, a CUT e a UNE, até grandes empresários e banqueiros nacionais.
Na contramão da expectativa popular, o governo Lula decidiu manter a mesma política econômica aplicada no Brasil desde fins do governo Sarney, visando garantir a prevalência, com maior rentabilidade, do capital financeiro nacional e internacional. Lula nomeou o principal executivo de um grande banco americano para a direção do Banco Central e escolheu um ministro da Fazenda que se tornou o fiador do governo junto aos altos círculos financeiros. Já na campanha eleitoral, a “Carta aos Brasileiros” reafirmava os compromissos de respeito aos contratos já firmados, com a manutenção das privatizações e com os serviços da dívida pública. Para contrabalançar, o presidente Lula acenou com políticas sociais assistencialistas e compensatórias, como o Fome Zero.
O caráter conservador das “reformas” apresentadas pelo governo foi explicitado através da contra-reforma da previdência, que atingiu direitos adquiridos pelo conjunto dos trabalhadores do setor público, com os velhos argumentos dos “privilégios” generalizados dos servidores públicos, apontados como os causadores do déficit da Previdência. Essa reforma apontou ainda para o estímulo à previdência complementar, abrindo espaço para a privatização do sistema e o enfraquecimento das organizações sindicais dos servidores públicos, ao passo que foram omitidas as reais causas do déficit – a longa lista de empresas devedoras do INSS e a nefasta prática de desviar recursos da Previdência para cobrir o orçamento financeiro e prover o pagamento de juros da dívida sempre em dia aos grandes banqueiros nacionais e internacionais.
A implantação das Parcerias Público-Privadas, as chamadas PPPs, e do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) demonstraram também o viés privatista do atual governo. Sob o regime de concessões, onde o setor privado entra com os lucros e o setor público com os riscos, o governo federal abdica de investir em várias faixas do setor público. O PAC visa facilitar a acumulação de capital, através do aporte de capital comandado pelo Estado, via recursos do FGTS, e da intensificação da exploração do trabalho. No mesmo sentido, vem o PROUNI, que transfere, por meio da renúncia fiscal, verbas públicas para o ensino privado em detrimento da rede de universidades federais. A compra de vagas na rede de ensino superior privada não vem acompanhada da ampliação das vagas e dos cursos nas universidades públicas.
A prática do assistencialismo em larga escala foi um fator decisivo para a reeleição de Lula, cujo governo criou, junto às massas, uma imagem de proteção aos mais pobres, em meio a um cenário de enormes lucros obtidos pelo grande empresariado industrial, pelo agronegócio e pelo sistema financeiro. Com amplo apoio da mídia, presta-se também a divulgar o mito de que a dívida externa não é mais problema, fingindo ignorar que a dívida pública externa continua pesando sobre o orçamento público e retirando do Brasil mais de US$ 30 bilhões por ano, entre juros e amortizações. Os juros da dívida interna alcançaram, no ano de 2009, o patamar de cerca de R$ 160 bilhões, enquanto as verbas para o Bolsa Família somaram apenas de R$ 12 bilhões. O fato é que os pagamentos antecipados da dívida externa ao FMI e ao Clube de Paris não reduziram a dívida, pois consistiram na troca de dívida velha por nova, mais cara, e também na troca de dívida externa por dívida interna, também mais cara.
Na verdade, do ponto de vista econômico, o Brasil se transformou no paraíso do grande capital. Os banqueiros e grandes capitalistas nunca ganharam tanto dinheiro nas últimas décadas, enquanto os trabalhadores e as camadas populares sofrem os reflexos das recorrentes crises econômicas. A política de favorecimento aos ricos e poderosos é alimentada por um banco central conservador, que se transformou numa agência de interesse do capital financeiro nacional e internacional. Esse choque de capitalismo – em que pese propiciar indicadores menos desumanos e gerar alguma blindagem contra a crise – empurra os problemas e tensões sociais com a barriga, pois as políticas compensatórias não têm condições de eliminar a miséria e a fome causadas pelo capitalismo, mas apenas administrá-las e mitigá-las.
Do ponto de vista político, portanto, podemos afirmar que a aparente disputa entre os dois grandes blocos de coligações partidárias nestas eleições brasileiras (Serra e Dilma) não coloca em jogo a natureza do Estado, que serve principalmente aos interesses do grande capital financeiro e industrial. Tampouco a pretensa “terceira via” de Marina Silva apresenta-se como uma alternativa de enfrentamento à ação deletéria do capital. Por outro lado, é preciso destacar a participação dos partidos de esquerda, PSOL, PCB e PSTU, em chapas próprias, apresentando programas políticos e históricos de lutas voltados à defesa dos verdadeiros interesses da classe trabalhadora, na perspectiva da superação do sistema capitalista em nosso país e no mundo.
O ENSINO PRIVADO E A LUTA SINDICAL
As políticas governamentais brasileiras têm-se caracterizado, notadamente nos últimos anos, pela combinação do progressivo abandono do caráter público da educação, na lógica da adoção de mecanismos privatizantes, que fomentaram o estímulo à expansão desenfreada do ensino privado. O mercado do ensino superior privado no Brasil agigantou-se nos últimos anos por duas razões principais: de um lado, a Lei de Diretrizes e Bases aprovada em 1996 passou a permitir a criação de escolas com fins lucrativos; de outro, o governo de Fernando Henrique Cardoso optou pela franca privatização da educação, ao deixar de investir nas universidades federais e autorizar a abertura sem freios do setor à iniciativa privada. Pesquisas realizadas ainda no ano de 2003 dão conta de um crescimento avassalador, denunciando aumento recorde do número de faculdades privadas no Brasil. Entre 2001 e 2003, a média foi de quase um estabelecimento particular por dia! A Era FHC representou o Éden para o ensino superior privado e o inferno para a escola pública.
O governo Lula, por sua vez, não procurou estancar o processo de sucateamento e privatização da universidade pública no país. Mantêm-se rebaixados os investimentos no ensino superior público, ao passo que aumenta o processo de adequação de critérios de mercado e lucratividade aos objetivos da educação pública. Segundo o artigo 212 da Constituição Federal, 18% das receitas da União devem ser aplicadas em educação. Mas os governos utilizam essa porcentagem para alimentar a expansão do ensino privado. Por exemplo, o anteprojeto de Reforma Universitária do Governo Lula busca garantir 75% desses recursos para as Instituições Públicas. Os outros 25% restantes seriam para financiar o PROUNI (Programa Universidade Para Todos) e o FIES (Financiamento Estudantil), uma clara injeção de recursos públicos no ensino privado.
A enorme expansão das instituições privadas de ensino (universidades, faculdades, centros universitários, escolas e etc) está estreitamente relacionada à atual situação das universidades públicas, uma vez que o crescimento das IPES (Instituições Privadas de Ensino Superior) ocorre, principalmente, através da renúncia fiscal por parte das mantenedoras, uma renúncia oferecida pelos governos federais como incentivo à “democratização do ensino”. Com esta renúncia, os recursos destinados ao ensino público ficam comprometidos. A educação-mercadoria passou a ser uma das fatias mais lucrativas do mercado, à medida que os investimentos são baixos, e o grande número de alunos dilui os custos. Vive-se hoje um acentuado movimento de fusões e aquisições de empresas educacionais, provocando o crescimento das IES de grande porte e o surgimento de holdings educacionais, com grandes instituições mantidas pela mesma mantenedora. Diversos grupos empresariais vêm se movimentando para comprar instituições de ensino, formar empresa de porte relevante e levá-la à Bolsa de Valores.
A desnacionalização da educação brasileira também é um processo em curso, com o investimento pesado de capital internacional na aquisição de redes e grupos educacionais privados no Brasil. Verifica-se, assim, a formação de grandes conglomerados nacionais e internacionais e uma “corrida de gigantes” para o controle da educação brasileira.
Em relação ao ensino fundamental e médio, o ensino privado também cresceu de forma desmesurada nos estados e municípios, como consequência do descaso de governos estaduais e prefeituras para com a educação pública. No vácuo da interminável crise da escola pública, em todos os cantos proliferam creches e escolas particulares, deflagrando um grau violento de competição na busca por alunos. Com isso, baixas mensalidades são ofertadas, por trás do que se verificam a queda vertiginosa na qualidade de ensino e o aprofundamento da desvalorização dos profissionais da educação.
Medidas adotadas pelas direções das escolas particulares vêm afetando negativamente as condições de trabalho dos profissionais da educação: redução de salário, demissões, redução do número de turmas, acompanhado do inchaço das mesmas (aumento do número de alunos por turma), corte de benefícios. Ignoram-se abertamente os acordos coletivos da categoria e a legislação trabalhista, com o não pagamento das “janelas” (os famosos “caixotes”), não pagamento do percentual do reajuste negociado, etc. Investimentos são feitos principalmente no patrimônio: computadores, salas, mobiliário, piscinas, quadras esportivas, reformas. Enquanto isso, o professor continua a ganhar pouco pela hora-aula, trabalhando em diversos colégios para aumentar seu ganha-pão. Quanto ao Plano de Carreira, previsto na LDB, os patrões recusam-se a discuti-lo.
Onde está a chave para o lucro fácil? Além das dificuldades enfrentadas pelo ensino público, hoje ainda mais precarizado pela ação criminosa de governos que congelaram os salários e adotaram políticas de contratação temporária de trabalhadores, determinante para o retorno garantido aos mercadores do ensino é a superexploração do professor, transformado em mão-de-obra barata, graças ao desrespeito total dos patrões aos seus direitos e à legislação trabalhista. Na contrapartida de uma pretensa maior oferta de empregos, na verdade empregos descartáveis, estabelece-se a relação flagrante de desrespeito às leis trabalhistas e aos acordos coletivos da categoria: atraso sistemático dos salários, trabalho sem carteira assinada, desconto sem depósito do FGTS, salários inferiores ao piso da categoria, horas extras não remuneradas, trabalho em atividades incompatíveis com as funções do professor, dentre muitas outras cláusulas, inclusive o não pagamento do 13º e do 1/3 de férias e até o não cumprimento do direito fundamental de férias.
Vivemos, no entanto, um quadro de desmobilização da nossa categoria, assim como ocorre com a maior parte dos sindicatos brasileiros nestes tempos neoliberais. Em nossas escolas, percebe-se, de um lado, uma postura de indiferença, com relação às lutas sindicais, da parte do professorado dos grandes estabelecimentos de ensino e, de outro, a paralisia dos professores das pequenas escolas, em função do medo do desemprego. Para além da atuação jurídica e do trabalho de agitação e propaganda dos Sindicatos, que necessitam ampliar sua política de denúncia das irregularidades nas escolas e de divulgação da imagem e das atividades da entidade, é necessário que busquemos retomar ações mais efetivas contra as empresas que sistematicamente vêm causando enormes prejuízos aos trabalhadores da educação. Se hoje é mais difícil mobilizar os trabalhadores, devemos procurar alternativas no sentido de tentar envolver o conjunto da sociedade, dirigindo também aos alunos e pais nossos boletins e panfletos, deixando-os a par das irregularidades cometidas pelas escolas particulares; promovendo manifestações na porta dos colégios com a presença da mídia, coletivas com a imprensa, atos públicos, etc.
Devemos ampliar nossas ações conjuntas com o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (SEPE), a fim de estreitar os laços de solidariedade dos trabalhadores da Educação em nosso Município e em toda a Região, na luta por uma escola democrática e de qualidade social. A FETEERJ deve avançar no trabalho de formação política e sindical de nossa categoria, para contribuir com o processo de conscientização dos trabalhadores da Educação na luta contra a exploração capitalista. Estreitar os laços com os movimentos da sociedade civil organizada deve ser um objetivo permanente, pois, dessa forma, podemos aprofundar nossos vínculos classistas, fortalecendo a classe trabalhadora na resistência aos ataques do capital e buscando sempre avançar na conquista de direitos. Somente a união do conjunto dos trabalhadores poderá garantir um dia a ultrapassagem deste sistema que nos explora e oprime e sua substituição por uma sociedade justa e igualitária.